Você por acaso já ouviu falar de Verlan? Pois bem, a língua francesa é, assim como todas as outras, uma língua viva. Então, quando a estudamos, é interessante levar em conta também elementos e modificações que por vezes não são oficiais. Mas que fazem parte da cultura e do cotidiano de quem a fala.

O português brasileiro, por exemplo, possui várias palavras muito utilizadas, mas que não estão presentes nos livros de gramática. Cara, mano, meu, beleza, da hora, joia, mala, pra caramba, falou, rolar, valeu… Exemplos não nos faltam!

E, assim como no Brasil, a França também tem uma série de gírias. Lá, elas ganham o nome de VERLAN.

Como funciona o Verlan?

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O VERLAN consiste em fazer a inversão (e as vezes até mesmo modificação) das sílabas das palavras. Assim forma-se uma palavra nova. A própria formação da palavra VERLAN traz a lógica da coisa. Ela é o produto da locução adverbial à l’envers (ao contrário), olha só:

À L’ENVERS = VERSL’EN = VERL’EN = VERLAN

Por isso que ela também é conhecida como a linguagem do espelho! As modificações como essa acima ocorrem, por sua vez, para evitar algumas fonéticas impossíveis na língua.

Mas qual seria a sua origem?

verlan o que é

Alguns pesquisadores da língua identificam alguns usos pontuais do Verlan desde a Segunda Guerra Mundial. Foi a partir dos anos 1970, porém, que ele começou a se popularizar.

Em um primeiro momento, o Verlan era utilizado como um código secreto, principalmente nas banlieues (periferia) francesas. Possuía o objetivo de evitar a compreensão das suas conversas por outros grupos.

Mas, conforme ela foi sendo empregada na música e no cinema, foi ficando cada vez mais popular. O cantor Renaud, em 1978, cantava “Laisse béton”, sendo béton o Verlan de tomber (cair).

O cineasta Claude Zidi também utilizou a gíria em seu filme Les Ripoux, de 1984. Ripoux é o Verlan de pourri que, além de significar podre, também era empregado para falar de policiais corruptos.

A partir dos anos 1980 a língua foi apropriada e passou a ser cotidianamente falada pela juventude das banlieues. Dessa forma, tornou-se uma linguagem social e, portanto, um elemento de identidade de seus habitantes.

Novas palavras foram sendo criadas ao longo do tempo. Algumas, inclusive, ganharam cada vez mais lugar na língua falada, principalmente pela influência do Hip Hop.

Mas, apesar de parecer fácil, vale dizer que nem sempre todo mundo consegue usar as gírias. Um exemplo foi a tentativa da SNCF de se aproximar dos jovens, utilizando em uma de suas propagandas de 1987 a frase “c’est blessipo“.

A ideia era fazer um Verlan com a palavra possible (possível). E para utilizar um português claro: não colou!

Exemplos Verlan 01

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A lista abaixo reúne alguns dos Verlans mais utilizados, com sua tradução e uma frase de exemplo:

  • Résoir: gíria para soirée (noite)
    • Ce résoir, je vais sortir avec mes amis / Essa noite, eu vou sair com meus amigos.
  • Chébran: gíria para branché (ligado, conectado, bem atualizado)
    • Le journaliste est chébran / O jornalista é bem atualizado.
  • Çaisfran ou cefran: gíria para français (francês)
    • Les élèves du cours de Francês com Mademoiselle parlent cefran / Os alunos do curso Francês com Mademoiselle falam francês.
  • Meuf: gíria para femme (mulher)
    • La meuf est allée au cinéma toute seule / A moça foi no cinema sozinha.
  • Biledé: gíria para débile (estúpido)
    • Tu es débile! / Você é estúpido!
  • Reum: gíria para mère (mãe)
    • Ma reum m’a dit qu’il est débile / Minha mãe me disse que ele é estúpido.
  • Keum: gíria para mec (rapaz, “cara”)
    • Qu’est-ce que c’est, keum? / O que é isso, cara?
  • Ouf: gíria para fou (doido, maluco)
    • C’est un truc d’ouf / É uma coisa de doido.
  • Vénère: gíria para énerver (bravo, irritado)
    • Je sais que cela va me vénere / Eu sei que isso vai me irritar.
  • Ripoux : gíria para pourri (podre – designar a polícia corrupta)
    • C’était une atitude ripoux / Foi uma atitude podre.
  • Chelou: gíria para louche (maluco)
    • L’histoire du pêcheur est chelou / A história do pescador é maluca.
  • Zicmu/Zic: gíria para musique (música)
    • Cette zicmu n’est pas en çaisfran / Essa música não é em francês.
  • Cimer: gíria para merci (obrigada)
    • Cimer, les moeufs! / Obrigada, meninas!
  • Iench: gíria para chien (cachorro)
    • Mon iench est sorti le résoir dernier / Meu cachorro saiu na noite passada.

Exemplos Verlan 02

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  • Chanmé: gíria para méchant (“irado”, no sentido de muito legal)
    • Ce voyage a été chanmé! cimer de m’avoir invité! / Essa viagem foi irada! Obrigada por ter me convidado!
  • Relou: gíria para lourde (“chato”, incômodo)
    • Mais que ce film est relou, keum… / Mas como esse filme é chato, cara…
  • Zarbi: gíria para bizarre (bizarro, estranho)
    • Mon voisin a l’air zarbi, un peu ouf / Meu vizinho parece estranho, meio louco.
  • Teuf: gíria para fête (festa)
    • Arrete de se véner, viens à ma teuf, ça va être chanmé! / Pare de se irritar, venha à minha festa, ela vai ser irada!
  • Zonmé: gíria para maison (casa)
    • Nous sommes à la zonmé depuis mars, c’est zarbi / Nós estamos em casa desde março, é estranho.
  • Reup: gíria para père (pai)
    • Mon reup est à la zonmé maintenant / Meu pai está em casa agora.
  • Reuf: gíria para frère (irmão)
    • J’appelle mon reuf, attends / Eu vou ligar para meu irmão, espere.
  • Fait ièch: gíria para fait chier (irrita)
    • Une teuf sans zicmu, ça fait ièch / Uma festa sem música, isso é entendiante.
  • Stiquemou: gíria para moustique (mosquito)
    • Ce stiquemou est terrible / Esse mosquito é terrível.
  • Golri: gíria para rigolo (engraçado)
    • Ce stiquemou est terrible / Esse mosquito é terrível.
  • Pécho: gíria para choper (pegar /ficar com alguém)
    • Ce stiquemou est terrible / Esse mosquito é terrível.
  • Tebé: gíria para bête (besta, bobo)
    • Ce stiquemou est terrible / Esse mosquito é terrível.

Mas, cuidado onde utiliza!

Hoje, o Verlan é muito usado pelos franceses em seu cotidiano, mas não são todas as pessoas francesas que usam, ok? Não adianta achar que porque vai aprender francês dá para usar com todos.

E, por mais que você pense que ele é uma linguagem que não faz parte da sua realidade, está mais perto do que parece. Certamente você já ouviu falar do cantor belga Stromae, né? Aquele que canta “Papaoutai”, “Formidable” e “Alors on danse” …

Pois saiba que o nome dele é um Verlan para maestro!

MAESTRO = STROMAE

Chanmé, hein? Então les meufs e le keums, vamos colocar em prática esse cefran ou çaisfran?

(O texto acima teve como fonte o vídeo “Le Verlan”, do canal Karambolage – ARTE).

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